Cargos de confiança podem ser dados, legalmente, a parentes. O
posicionamento jurídico dos tribunais, entretanto, não exclui outras
realidades, até porque a vida é maior do que a lei, ainda que aquela precise
desta para ser segura, na maioria dos casos.
Temos visto em algumas prefeituras do Brasil não apenas um processo numericamente forte de
nomeação de parentes de uma mesma família - a família do prefeito - para os cargos da administração da
cidade, mas também dos que administram pastas apenas para "inglês
ver", enquanto o gestor de uma ou de determinadas secretarias, por
exemplo, acaba sendo outro membro do mesmo clã.
Mas não é apenas isso. Os cargos políticos também são geneticamente ocupados. Nas presidências das Câmaras, por exemplo, pode estar um parente também.
Até aí tudo bem, afinal, o vereador teria sido, nessa hipótese, eleito "democraticamente" por
seus pares, embora estes, certamente, tenham recebido uma sugestão paterna para
fazê-lo. Mas daí a articular uma manobra política (ainda que legal) para
perpetuar sua presidência, em outra hipótese, seria a garantia de que não haveria outro interesse deste tipo de governo que não fosse manter o poder cada vez mais em torno de uma só célula
familiar.
A insatisfação, nesses casos, seria interna e externa. Um grupo minúsculo, de não mais de 6
pessoas, "governaria" a cidade, restringindo em suas mãos, na prática,
todas as pastas, todos os recursos a serem destinados à cidade e todas as
estruturas políticas. Neste grupo, nem precisaria dizer, todos teriam o mesmo
sobrenome, direta ou indiretamente, ou ao menos o adotariam por afinidade.
Nossa postura fixa, definida e imutável, é a mesma sempre: aqui não se
fala da vida pessoal de ninguém. Nosso debate é político, institucional e
social. Há casos, entretanto, ao contrário disso, nos quais a própria família é que transforma a
si mesma no Estado, tornando-se uma só com um governo, e, portanto, se
submetendo ao processo de crítica política - é a Oligarquia, tão presente na
história do coronelismo brasileiro.
Vivemos sim, em algumas prefeituras do Brasil, o renascimento triste e doloroso dos tempos nos quais um só ou
pouquíssimos sobrenomes mandavam - ou ao menos tentavam mandar - em tudo e em
todos, guardando para si o poder que deveria ser, administrativamente, dividido
entre os quadros de um grupo político; e socialmente, oferecido em forma de
política pública ao povo.
No primeiro caso, cabe lembrar que o motivo pode ser que tais governos tenham poucos quadros políticos para ocupar as centrais da administração
municipal. Mas isso não justifica o processo de familiarização do poder: deve haver alguns bons técnicos e administradores nessas situações. Estes,
porém, ficam renegados à periferia da periferia do poder, apartados das
benesses justas de um governo, em prol de um ou poucos sobrenomes. E isso,
certamente, traz a insatisfação das ruas para dentro desses próprios grupos governistas, fatalmente esfacelados pela centralização familiar de uma gestão.
Já no caso da ausência de políticas públicas, que impede que o poder seja
partilhado com o povo, cabe perguntar a estes mesmos governos oligárquicos/familiares os motivos pelos quais municípios ricos estejam tão carente de
investimentos, especialmente, na periferia, indo da gaze dos hospitais à ruas sem
asfalto. Para onde está indo o dinheiro?
Eu tenho uma suspeita. Mas isso é coisa para se discutir em família.
Bom dia!