
O surgimento de concursos públicos a torto e a direito no final de 2009, porém, manifesta-se como uma moda das administrações públicas apenas de maneira aparente. Os concursos públicos, como as Conferências Municipais, por exemplo, podem ser propostos pelo poder público a qualquer momento, mas estouram neste fim de ano por imposição e determinação de prazo, seja por parte da justiça (no caso dos concursos) ou do Governo Federal (no caso das Conferências). Além disso, temos a proximidade do ano eleitoral, no qual determinadas modalidades de concursos públicos não são permitidos. Nesse sentido, mais que uma “moda” momentânea de administração pública, os concursos atuais são obrigações legais, que caracterizam, em alguns casos, punições aos entes e administradores que não os lançarem.
Por outro lado, há uma outra moda, da parte dos governantes e órgãos em geral, que consiste em anunciar sua própria boa-vontade, bondade e santidade nos lançamentos de concursos, como se, além de um gesto de coragem e carinho pela lisura, fosse o concurso lançado um favor dos administradores oferecido com lágrimas de emoção a uma população com baixo índice empregatício.
Portanto, já que o concurso público, além de moda, é visto como favor, fica fácil imaginar por que os editais são, em geral, mal feitos e displicentes com detalhes caros aos candidatos, posto que a relação entre poder público e cidadãos ainda é vista, em grande parte, como um relacionamento entre doador e receptor, na qual o cidadão, como receptor da oportunidade de emprego, não teria o direito de olhar os dentes do cavalo dado pelo administrador público.
Por causa dessa mentalidade, nosso país não possui, por exemplo, uma legislação clara e minuciosa sobre concursos públicos e editais, que atinja não só os poderes públicos, mas também as empresas organizadoras. Temos ditames legais que garantem o estágio probatório, a obediência ao número de vagas propostas, a ordem de convocação, prazos de duração do concursos, etc., porém, detalhes importantes de editais ficam a cargo das empresas organizadoras: a data das provas, por exemplo, pode ficar em aberto durante todo o tempo da inscrição, assim como as bibliografias não são obrigatórias.
Essas questões, entretanto, não são problemas apenas locais: recentemente, um órgão público federal ligado à cultura lançou edital afirmando que apenas no final de novembro divulgaria a data das provas, ainda que as inscrições comecem semana que vem. Uma Universidade Pública Federal lançou concurso para o quadro administrativo, cujas provas já foram realizadas, omitindo em seu edital, entretanto, qualquer bibliografia. Ao ligarmos para a empresa organizadora e questionar o fato, fomos informados que a mesma “jamais divulga bibliografias em concursos”, dificultando o universo de estudo do candidato, ainda mais em questões educacionais, onde as linhas de análise variam muito entre as obras.
Há, portanto, uma moda de concursos públicos nessa linha primavera-verão de fim de ano. Uma moda, porém, que se utiliza de vestes voluntariosas, a fim de disfarçar imposições jurídicas e displicência com algumas necessidades dos candidatos. Os estilistas dessa moda estranha são, com certeza, os legisladores federais, omissos em regulamentar com especificidade os concursos públicos, seus editais e empresas organizadoras. Cabe a nós, portanto, fazer voltar às passarelas uma moda “retrô” reivindicatória, juntamente às autoridades competentes, para tirarmos de uma vez a fantasia de devedor e vestirmos novamente nossa carapuça de credores e/ou parceiros atentos do Poder Público.